Um mergulho para dentro: conexões

Por: Sandra Maria de Sousa Pereira – Imagem Maksim Chernyshev  on  Scopio

Você às vezes sente um vazio que nada no mundo concreto e racional parece preencher? Nenhuma atividade, realização etc.?

Quem nunca? Você não está sozinho. Sei bem disso…

O que acontece é que você – e eu -, como a maioria das pessoas da nossa cultura, busca significado e sentido no mundo, que é essencialmente complexo e multidimensional, usando meios racionais e lineares, que não conseguem abarcar essa complexidade.

Como seres humanos, também somos complexos e compostos por diversas dimensões, que vão do mais concreto ao mais sutil.

A resposta que buscamos para essas questões está na valorização e integração de todas essas nossas dimensões, de um modo coerente.

Nosso ser integral reside no pensar, sentir e agir… somos cabeça, coração e ventre.

Nossa cabeça traz o nosso pensar, nossa capacidade de discernimento, julgamento, de uma maneira mais linear.

Nosso ventre é o centro do agir, que nos traz nosso impulso vital, nossa capacidade de ação.

Nosso coração nos permite sentir, trazendo a sabedoria, a intuição, de uma forma mais que circular: esférica. É aí que tudo se integra e se conecta.

Atualmente, passamos muito tempo focados no desenvolvimento do nosso lado mais racional, buscando apoio e resultados no mundo externo, que é a morada dos dados, fatos, estruturas, realizações, organizados de modo linear.

Esse foco nos traz muitos benefícios, incluindo o desenvolvimento e uso do método científico e a objetividade. Mas também traz alguns problemas, como a visão binária, o estilo ganha-perde e a visão puramente utilitária, que leva à exploração.

Entendemos tudo conceitualmente, porém somente essa abordagem não nos permite lidar com a riqueza e complexidade de nós mesmos e do nosso mundo, intensificada pelo uso crescente da tecnologia.

Ao privilegiarmos, na nossa cultura, esse lado mais racional como medida e resposta a tudo, acabamos deixando de lado ou desvalorizando as informações valiosas que nos vêm do coração e do ventre.

A própria ciência tem se deparado com essa limitação, quando se debruça no tema da física quântica, que demonstra que a realidade é composta ao mesmo tempo tanto por componentes objetivos quanto subjetivos.

A visão holística, integral e, por que não dizer, quântica, nos convida a acolher e reintegrar essas partes negligenciadas de nosso ser, ou seja, a subjetividade, as emoções e os instintos, que fazem parte de nós há muito mais tempo que a parte racional.

Para isso, precisamos resgatar e respeitar os nossos instintos, que nos permitem ter a percepção de nossas necessidades básicas e garantem a nossa segurança, avisando-nos dos perigos antes de qualquer percepção racional.

Curiosamente, a palavra para intestino em inglês é gut, que também é usada para instinto e intuição, ou seja, aquilo que sabemos em primeira mão, em nossas entranhas, sem explicação racional.

Nosso ventre é a sede desses instintos básicos e também do nosso desejo, das motivações propulsoras de nossas ações transformadoras no mundo. Sem essa força, não há ação nem realização.

A conexão com nossas emoções e sentimentos é o outro aspecto dessa integração. Para isso, temos de observar, estar atentos e localizar nossas sensações no nosso corpo, sem julgamentos, resgatando o sentir.

Mergulhar no nosso sentir, no nosso coração, nos permite mergulharmos no Ser integral.

Mais uma vez, pelo caminho da ciência, nos chegam informações dessa integração possível e essencial. Pesquisas recentes descobriram que há células neuronais tanto no nosso coração quanto no nosso intestino (que hoje já é considerado como o nosso segundo cérebro), todas importantes para o nosso funcionamento perfeito.

Faz-se necessário nos voltarmos para a nossa verdadeira natureza complexa, integrando essas perspectivas de forma coerente e autêntica.

Mas como fazer isso?

As tradições espirituais há muito tempo referem-se ao “caminho do coração” e ao coração como sendo sede do Ser, da essência.

Existem muitas maneiras de percorrer esse caminho e todas passam por fazer uma viagem para o lado de dentro, ser viajante e desbravador do nosso mundo interno.

Isso permite que os nossos três centros de inteligência, nossos três cérebros, trabalhem de modo integrado e coerente, ampliando o nosso autoconhecimento de forma vivencial e concreta.

É preciso conhecer, reconhecer, abrir e expandir nossos espaços internos, por meio de atividades que nos conectem com nosso sentir e nosso impulso vital, e esses se integrem ao nosso cérebro, ampliando nossas conexões neuronais e, a partir daí, expandir nossa capacidade de lidar com a complexidade.

A expansão da consciência é um trabalho interno, campo de estudo de vários ramos da ciência mais holística, como por exemplo a Psicologia Transpessoal, que inclui, mas não se limita aos conhecimentos profundos da Psicologia tradicional, abrangendo também outras possibilidades de acesso a essas dimensões internas, tais como meditação, regressões, psicoterapia, psicossíntese, terapias integrativas, respiração holotrópica, constelações sistêmicas, atividades de centramento, estudo das tradições religiosas etc.

Nesse caminho, há muito tempo venho fazendo formações e vivências, tais como pós em Psicologia Transpessoal, mestrado em Reiki etc.

Recentemente (de 2018 para cá), ampliei esses conhecimentos com formações em constelação familiar, terapia quântica, coerência de valores, regressões e codificação emocional (Método Benedí®).

Foram cursos e vivências avassaladores na transformação que trouxeram para a minha vida, minha compreensão, e também para a vida das pessoas com quem tive oportunidade de trabalhar usando essas técnicas.

Descobri que esta é uma forma muito concreta de atuação no desenvolvimento humano (minha paixão!), paralelamente aos meus trabalhos de treinamento, mentoria e coaching, que continuam firmes e fortes, na vertente mais racional e estruturada.

Do mesmo modo, na minha escrita, esses vários aspectos se manifestam, desde os textos mais técnicos sobre coaching e desenvolvimento humano até textos mais intuitivos, como ficcão e a poesia. Tudo se integra e se retroalimenta.

Quaisquer que sejam os caminhos escolhidos para nos levar ao nosso centro e ajudar a nos conhecermos melhor e nos conectarmos com nossos valores e nossas forças, incluindo as dimensões humanas mais sutis,  é importante que isso seja de feito de modo sério, consciente e lúcido, livre de ilusões e mistificações.

A expansão da consciência é uma verdadeira viagem – para e por dentro. E, assim como nos conecta dentro, nos conecta também com o lado de fora: o inconsciente coletivo, os campos morfogenéticos, toda a rede de energia e de relações sistêmicas que nos fazem seres humanos verdadeiramente humanizados.

Quando somos capazes de realizar essa viagem para dentro, tomamos consciência de que a transcendência está dentro de nós. Não vem de fora e não nos torna dependentes. Nos liberta.

São viagens por mundos especiais, que nos trazem mensagens valiosas sobre nós mesmos e nossos potenciais ampliados.

Esta é a tecnologia mais avançada a que se tem acesso até o momento.

Viajar para o lado de dentro é a fronteira mais importante que temos a conquistar, como já disse lindamente o Poeta no poema O Homem: as viagens, sobre o qual agora tenho um entendimento ainda mais amplo:

O Homem: as viagens

O homem, bicho da terra tão pequeno
Chateia-se na terra
Lugar de muita miséria e pouca diversão,
Faz um foguete, uma cápsula, um módulo
Toca para a lua
Desce cauteloso na lua
Pisa na lua

Planta bandeirola na lua
Experimenta a lua
Coloniza a lua
Civiliza a lua
Humaniza a lua.

Lua humanizada: tão igual à terra.
O homem chateia-se na lua.
Vamos para marte – ordena a suas máquinas.
Elas obedecem, o homem desce em marte
Pisa em marte
Experimenta
Coloniza
Civiliza
Humaniza marte com engenho e arte.

Marte humanizado, que lugar quadrado.
Vamos a outra parte?
Claro – diz o engenho
Sofisticado e dócil.
Vamos a vênus.
O homem põe o pé em vênus,
Vê o visto – é isto?
Idem
Idem
Idem.

O homem funde a cuca se não for a júpiter
Proclamar justiça junto com injustiça
Repetir a fossa
Repetir o inquieto
Repetitório.

Outros planetas restam para outras colônias.
O espaço todo vira terra-a-terra.

O homem chega ao sol ou dá uma volta
Só para tever?
Não-vê que ele inventa
Roupa insiderável de viver no sol.
Põe o pé e:
Mas que chato é o sol, falso touro
Espanhol domado.

Restam outros sistemas fora
Do solar a col-
Onizar.
Ao acabarem todos
Só resta ao homem
(estará equipado?)
A dificílima dangerosíssima viagem

De si a si mesmo:
Pôr o pé no chão
Do seu coração
Experimentar
Colonizar
Civilizar
Humanizar
O homem
Descobrindo em suas próprias inexploradas entranhas
A perene, insuspeitada alegria
De con-viver.

(ANDRADE, Carlos Drummond de. As impurezas do branco. 4ª ed.  Rio de Janeiro: José Olympio, 1978.)

REFERÊNCIAS

Por que o intestino é considerado nosso 2o. Cérebro e outros 5 fatos surpreendentes sobre o órgão:

https://www.bbc.com/portuguese/geral-45664504

https://saude.abril.com.br/mente-saudavel/a-incrivel-conexao-cerebro-intestino/

Sobre ressonância mórfica:

http://www.esalq.usp.br/lepse/imgs/conteudo_thumb/Resson-ncia-m-rfica.pdf

4 comentários

  1. Gostei muito do texto. Interessante que a expressão “have de guts” (ter coragem) me marcou muito, a ponto de eu não a ter esquecido, já que entrei em contato com ela há mais de 20 anos nas aulas de inglês, o que confirma, mais uma vez, que tudo o que buscamos está do lado de dentro, e não de fora.

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  2. Gostei muito do texto. Interessante que a expressão “have the guts” (ter coragem) me marcou muito, a ponto de eu não a ter esquecido, já que entrei em contato com ela há mais de 20 anos nas aulas de inglês, o que confirma, mais uma vez, que tudo o que buscamos está do lado de dentro, e não de fora.

    Curtido por 1 pessoa

    1. Que legal. Também gosto dessa expressão. Ela é bem forte. Também existe a “feel in the guts”, ou seja, saber com certeza, com profundidade. Realmente, tudo está dentro de nós. Obrigada por comentar!!!

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