Nesse momento, em que vemos uma extrema exacerbação do radicalismo e individualismo em vários campos (social, econômico, cultural, ideológico, político etc.), percebemos felizmente que existe também a emergência de um movimento de contraposição, que busca a cultura de compartilhamento, cooperação e valorização do espírito comunitário.
Aqui e ali proliferam iniciativas de compartilhamento em várias áreas, muitas delas facilitadas pelos benefícios da internet, rede mundial de computadores em que o compartilhar é muito mais que um simples botão de aplicativo.
São atividades como troca e empréstimo de objetos (Tem Açúcar?), troca de experiências, aluguel ou troca de hospedagens (Airbnb, couchsurfing), empréstimo ou aluguel de automóveis pessoais e espaços compartilhados de trabalho (coworking), financiamento coletivo (crowdfunding) etc., que surgem como forma não só de potencializar os recursos à disposição de todos, mas também de evitar desperdícios, contribuindo para a preservação do meio ambiente.
Participar de uma ou mais dessas experiências de compartilhamento (gratuito ou pago), permite que nós vivenciemos uma nova mentalidade fora do individualismo, pois o compartilhamento é também uma das portas de entrada para uma vida com valores mais humanos, comunitários e cooperativos, em que o encontro tem o potencial de gerar uma inteligência coletiva, mais criativa e calorosa.
Você já ouviu falar da filosofia Ubuntu?
Nesse espírito de compartilhamento, vale a pena conhecer um pouco mais sobre o Ubuntu.
Ubuntu ficou conhecida como uma filosofia africana, que fala de relacionamento e da importância da comunidade para nos definir.
Ubuntu significa “Eu sou porque nós somos”. Ou seja: eu só existo porque nós existimos.
É também uma regra de conduta ou ética social, que inclui respeito pela religiosidade, individualidade e diversidade, sempre integrados na comunidade.
Em um sentido mais geral, ubuntu também significa compaixão, calor humano, compreensão, respeito, cuidado, partilha, humanitarismo, ou seja, amor.
Segundo o espírito de ubuntu, as pessoas não devem levar vantagem pessoal em detrimento do bem-estar do grupo. Para que uma pessoa seja feliz, será preciso que todas do grupo se sintam felizes. Estamos conectados uns com os outros, e essa relação estende-se aos ancestrais e aos que ainda nascerão.
Eu e o outro somos uma só vida. Prejudicar o outro é prejudicar a si mesmo. Deixar que o outro seja prejudicado, é prejudicar a si mesmo e diminui toda a comunidade.
A máxima Zulu, uma das 11 línguas oficiais da África do Sul, umuntu ngumuntu ngabantu significa que uma pessoa só é uma pessoa através de outras pessoas.
Ubuntu traduz uma crença profunda no compartilhamento, na solidariedade, que conecta toda a humanidade, por meio da empatia, a partir do reconhecimento de que, apesar de únicos, somos todos iguais na nossa essência humana.
Desmond Tutu, Nelson Mandela e o Ubuntu
Esse conceito ficou muito conhecido na história da luta contra o Apartheid na África do Sul e inspirou Nelson Mandela na promoção de reconciliação nacional.
“O UBUNTU não significa que uma pessoa não se preocupe com o seu progresso pessoal. A questão é: o meu progresso pessoal está ao serviço do progresso da minha comunidade? Isso é o mais importante na vida. E se uma pessoa conseguir viver assim, terá atingido algo muito importante e admirável.” (Nelson Mandela)
Segundo o arcebispo anglicano Desmond Tutu, Prêmio Nobel da Paz em 1984 por sua luta contra o Apartheid, “a minha humanidade está indissoluvelmente ligada à sua humanidade“.
“Ubuntu (…) é a essência do ser humano. Ele fala do fato de que minha humanidade está presa e está indissoluvelmente ligada à sua. Eu sou humano, porque eu pertenço. Ele fala sobre a totalidade, sobre a compaixão. Uma pessoa com ubuntu é acolhedora, hospitaleira, generosa, disposta a compartilhar. A qualidade do ubuntu dá às pessoas a resiliência, permitindo-as sobreviver e emergir humanas, apesar de todos os esforços para desumanizá-las.” (Desmond Tutu)
Uma história com coração
Histórias com coração são aquelas que nos falam diretamente à alma e deixam um conceito muito mais claro do que longos textos de explicação racional.
Existe uma história bastante conhecida que ilustra muito bem o conceito de Ubuntu, com o qual ainda temos muito a aprender na nossa cultura ocidental em geral.
“Um antropólogo que estudava os usos e costumes de uma tribo africana propôs uma brincadeira inofensiva às crianças. Encheu um pote com doces e guloseimas e colocou-o debaixo de uma árvore.
Depois, chamou as crianças e combinou que quando desse o sinal, elas correriam para o pote, e a que chegasse primeiro ficaria com todos os doces que estavam lá dentro.
As crianças posicionaram-se na linha de partida que ele desenhou no chão e esperaram pelo sinal combinado.
Quando ele deu o sinal, todas as crianças deram as mãos e começaram a correr em direção à árvore onde estava o pote. Quando lá chegaram, distribuíram os doces entre si e começaram a comê-los.
O antropólogo foi falar com as crianças e perguntou porque razão tinham ido todos juntos, sendo que o primeiro a chegar ficaria com tudo que havia no pote e, assim, comeria muito mais doces.
As crianças responderam: “Ubuntu, tio. Como poderia um de nós ficar feliz se todos os outros estivessem tristes?”
Ele ficou desconcertado! Meses e meses trabalhando, estudando a tribo, e não tinha compreendido, de verdade, a essência daquele povo. Ou jamais teria proposto a competição…
Ubuntu significa: “Eu sou quem sou, porque somos todos nós!”
Rede Ubuntu – um exemplo concreto entre nós
Temos no Brasil um exemplo muito bom da aplicação desse conceito ao mundo do trabalho e da contribuição social.
A Rede Ubuntu utiliza um conceito de funcionamento em rede, por meio do qual desenvolvem o Eupreendedorismo. Se define como “rede colaborativa de pessoas e organizações dedicadas ao desenvolvimento do EUpreendedorismo pelo mundo.”
Trata-se de um trabalho muito sério, de profunda reflexão e competência, que vem sendo cada vez mais reconhecido tanto no Brasil como no mundo.
“Nós, da Rede UBUNTU, acreditamos em um mundo onde um indivíduo é capaz de fazer uma diferença enorme, ao mesmo tempo que se potencializa com a força de processos coletivos. (…) Acreditamos em um modelo de negócios e de atuação feito de forma colaborativa, por meio de indivíduos e organizações que compartilham os mesmos ideais. (Rede Ubuntu).
Vale a pena conhecer!
O que tem no Ubuntu aqui e agora para você?
Busque na sua essência a sua maneira única de ser e contribuir, seu propósito.
Conheça as formas colaborativas que existem na sua comunidade, bairro, país e escolha a que mais combina com você. Sempre haverá um jeito parecido com você… se não houver, crie o seu!
Encontre formas de viver seu propósito, individual e coletivamente, tornando-se cada vez melhor e contribuindo para que os outros, sua comunidade e o mundo também sejam cada vez melhores, num lindo círculo virtuoso.
Simples assim!
Para Saber Mais:
Ubuntu Experience – Nelson Mandela – https://www.youtube.com/watch?v=RGFdkBI0TcI
Ubuntu nas palavras de Desmond Tutu – https://www.youtube.com/watch?time_continue=11&v=Ux1kEj_CgHE
Boyd Varty, ativista ecológico, fala de Ubuntu – https://www.ted.com/talks/boyd_varty_what_i_learned_from_nelson_mandela?language=pt-br
Apresentação sobre Ubuntu – https://www.youtube.com/watch?v=J5bgB2hXhtQ
Filme Em Minha Terra (In My Country) – trecho que aborda Ubuntu – https://www.youtube.com/watch?v=vJABKKGm5q8
Rede Ubuntu – http://www.redeubuntu.com.br/
Compartilhamento de objetos entre vizinhos (site e app): http://www.temacucar.com/
Outras iniciativas interessantes: http://www1.folha.uol.com.br/mercado/2015/05/1627253-aplicativos-e-sites-oferecem-da-troca-de-objetos-ao-aluguel-de-vestidos-usados.shtml